9.1

Solução Natural

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AjudaCapítulo 10Capítulo 8Capítulo 9Secção 9.2

9.1.1 Circuitos RC e RL

Designa-se por regime, solução ou resposta natural a dinâmica temporal de um circuito excitado pelas energias armazenadas nos condensadores e nas bobinas que o constituem. Ao contrário dos circuitos puramente resistivos, nos quais a ausência de fontes independentes determina o valor nulo das correntes e das tensões no mesmo, os circuitos RC, RL e RLC sem fontes independentes podem apresentar dinâmicas não nulas como resultado das energias eléctrica e magnética inicialmente armazenadas nos condensadores e nas bobinas. Abordando o tópico de um outro prisma, pode dizer-se que o regime natural é a dinâmica da descarga dos condensadores e das bobinas, designadamente através de elementos dissipadores de energia, como as resistências.

Considere-se o circuito RC representado na Figura 9.1.a

Figura 9.1 Circuitos RC (a) e RL (b) de 1ª ordem

e aplique-se a Lei de Kirchhoff das correntes ao nó X,

iC(t) + iR(t) = 0 (9.1)

Por substituição das características tensão-corrente dos elementos, iR=vR/R e iC=CdvC/dt, obtém-se a equação diferencial linear de 1.ª ordem

(9.2)

cuja solução determina a dinâmica temporal da tensão e da corrente aos terminais do condensador e da resistência.

Considere-se agora o circuito RL representado em 9.1.b. A aplicação da Lei de Kirchhoff das tensões à malha permite escrever a igualdade

vL(t) - vR(t) = 0 (9.3)

que, por substituição das características tensão-corrente dos elementos, vR=RiR e vL=LdiL/dt, conduz à equação diferencial linear de 1.ª ordem

(9.4)

As equações diferenciais (9.2) e (9.4) apresentam a forma comum

(9.5)

em que t=RC em (9.2) e t=L/R em (9.4) se designam por constante de tempo do circuito. A equação (9.5) é vulgarmente designada por equação diferencial homogénea de 1.ª ordem, sendo a sua solução designada por homogénea, natural ou regime natural do circuito.

9.1.2 Solução Natural

A equação diferencial homogénea em (9.5) pode ser resolvida recorrendo a um de dois métodos alternativos: por resolução da equação em ordem à variável x(t), ou por aplicação da transformada de Laplace. Por exemplo, o primeiro método consiste em resolver a equação diferencial em ordem à variável x(t)

(9.6)

que equivale a

(9.7)

a qual, por integração de ambas as partes,

(9.8)

conduz ao resultado

(9.9)

ou ainda

(9.10)

em que A e B são constantes e A=eB. Adiante ver-se-á que a constante A é determinada por imposição das condições inicial e de continuidade da energia armazenada nos elementos bobina ou condensador. Retomando as equações diferenciais (9.2) e (9.4) e o resultado em (9.10), verifica-se que a dinâmica temporal da tensão aos terminais do condensador e da corrente na bobina são expressas pela função exponencial negativa

(9.11)

com t=RC, e

(9.12)

com t=L/R, respectivamente. As soluções naturais (9.11) e (9.12) são características intrínsecas dos circuitos respectivos. Ambas determinam a dinâmica da descarga da energia armazenada no condensador ou na bobina.

O método de resolução de equações diferenciais por aplicação da transformada de Laplace será introduzido no Capítulo 10.

9.1.3 Condições Inicial e de Continuidade

A energia armazenada num condensador ou numa bobina é necessariamente uma função contínua no tempo. Como se concluiu nos Capítulos 7 e 8, a não-verificação da continuidade da energia armazenada nos condensadores e nas bobinas conduz, respectivamente, a valores de corrente e de tensão de amplitude infinitamente elevados.

A imposição da condição de continuidade da energia eléctrica armazenada num condensador

(9.13)

equivale a exigir a continuidade da tensão aos terminais respectivos

(9.14)

ao passo que a continuidade da energia magnética armazenada numa bobina

(9.15)

equivale a impor a continuidade da corrente

(9.16)

Considerem-se então os circuitos RC e RL representados na Figura 9.2 e admita-se que são conhecidas a tensão aos terminais do condensador e a corrente na bobina no instante de tempo t=0, vC(t=0)=Vo e iL(t=0)=Io respectivamente.

Figura 9.2 Solução natural de circuitos RC (a) e RL (b) de 1.ª ordem isto é, impõe a igualdade A=Vo. A dinâmica da descarga do condensador é então expressa pela função exponencial negativa (Figura 9.2.a)

Por exemplo, no caso do circuito RC verifica-se que

(9.17)

e que a condição de continuidade da energia eléctrica armazenada exige que

(9.18)
t>0 (9.19)

Referindo agora o circuito RL representado na Figura 9.2.b, pode facilmente demonstrar-se que a imposição da continuidade da corrente na bobina em t=0 permite obter a solução (b)

t>0 (9.20)

Como se constata, a constante de tempo do circuito constitui uma medida do tempo necessário para a extinção do regime natural respectivo. Verifica-se assim que no instante de tempo t=t as variáveis vC(t) ou iL(t) se encontram já reduzidas a uma fracção 1/e do seu valor inicial, ao passo que para t=10t esta fracção é de apenas 4.5*10-5. Enquanto um circuito RC com capacidade do condensador e resistência, respectivamente, C=1 mF e R=1 MW, tem uma constante de tempo t=1 s, o mesmo circuito com C=1 nF e R=1 kW revela uma constante de tempo t=1 ms, portanto, um milhão de vezes inferior. Na Figura 9.3 comparam-se os regimes naturais de um mesmo circuito RC com diferentes constantes de tempo.

Figura 9.3 Solução natural de um circuito RC em função da constante de tempo

9.1.4 Solução Natural Comutada

Considere-se o circuito RC representado em 9.4.a. Admita-se que os interruptores S1 e S2 são colocados em condução nos instantes de tempo t=0 e t=t1>0, respectivamente, e que a tensão inicial aos terminais do condensador é vC(0)=Vo.

Figura 9.4 Solução natural comutada

Como é patente em (b), durante o intervalo de tempo 0<t<t1 o circuito coincide com a malha RC estudada anteriormente, ou seja,

0<t<t1 (9.21)

a qual, dadas as condições inicial e de continuidade

(9.22)

conduz à solução

0<t<t1 (9.23)

Considere-se agora o circuito após a comutação em t=t1 do interruptor S2 (c). Neste caso, a tensão aos terminais do condensador é dada pela expressão

t > t1 (9.24)

cuja constante de tempo coincide com o produto da capacidade do condensador pela resistência equivalente vista dos seus terminais, t2=(R1//R2)C. A imposição das condições inicial e de continuidade da energia armazenada no condensador em t=t1

(9.25)

permite obter o valor da constante A2

(9.26)

e assim escrever a solução final na forma (Figura 9.4.d)

t > t1 (9.27)

A condição (9.25) e a solução (9.27) permitem retirar as seguintes conclusões relativamente à solução natural comutada:

(i) a condição inicial da tensão após a comutação do interruptor S2 (Figura 9.4.c) coincide com o valor final da mesma no circuito prévio à comutação (Figura 9.4.b);

(ii) para t>t1, o condensador descarrega-se com uma constante de tempo diferente daquela válida durante o intervalo 0<t<t1. Em qualquer dos dois casos, a constante de tempo de descarga é dada pelo produto da capacidade pela resistência equivalente de Thévenin aos terminais do condensador.

A Figura 9.4.d ilustra a dinâmica temporal da tensão aos terminais do condensador quando em t=t1=t1 se introduz em paralelo com R1 uma resistência de valor nominal R2=R1/10.

9.1.5 Energia Armazenada e Dissipada

Considere-se um circuito RC de 1.ª ordem e admita-se que a tensão inicial aos terminais do condensador é vC(0)=Vo, ou seja, que a energia eléctrica inicialmente armazenada é WC=(1/2)CVo2. Uma vez que a descarga do condensador se processa de acordo com a expressão

t > 0 (9.28)

verifica-se que ao longo do tempo existe uma igualdade entre as energias perdida pelo condensador

(9.29)

e dissipada na resistência

(9.30)

e que, em particular, no limite quando t ® ¥ , a energia armazenada no condensador é totalmente dissipada por efeito de Joule na resistência.

É fácil demonstrar que num circuito RL também se verifica uma igualdade entre as energias perdida pela bobina e dissipada pela resistência, neste caso

(9.31)